Jovens protestam em Lille contra a reforma da previdência proposta pelo governo de Nicolas Sarkozy
Entre seus 4 milhões de estudantes, por enquanto são somente algumas dezenas a centenas de milhares deles que se manifestam contra a reforma da previdência – mas eles apavoram os poderes públicos. Os baderneiros são alguns milhares, muitos deles vindos de bairros desfavorecidos, violentos e minoritários – mas eles afligem a sociedade que preferiria se esquecer, fora a época do aniversário dos tumultos do outono de 2005, da guetificação de parte de seus subúrbios.
A mobilização estudantil atual não tem muito a ver com a previdência – é muito mais profunda, mais grave, mais enigmática. Mais imprevisível também: embora as organizações de jovens tenham feito uma convocação para uma nova manifestação, na quinta-feira (21), ninguém é capaz de dizer se o movimento sobreviverá às férias de Todos os Santos, e sob qual forma. Ninguém sabe tampouco se os atos de violência podem se ampliar ou sair de cena tão bruscamente quanto surgiram.
Se a situação atual é de alto risco, é porque entram em colisão dois medos franceses: o medo tradicional, de uma sociedade que envelhece diante de sua juventude turbulenta; e o medo novo, de uma sociedade que se descobre multiétnica e multicultural. Na angústia coletiva do momento, revelam-se os tabus da França, sua grande dificuldade em se olhar de frente, seu temor em se aceitar como é, certamente porque, em nossa religião republicana, é difícil admitir que as promessas de igualdade e de integração não estão sendo cumpridas.
O primeiro tabu diz respeito à questão das gerações. No DNA dos políticos franceses, a juventude é primeiramente um perigo, uma ameaça antes de ser uma possibilidade ou uma esperança. Como se a lembrança de 1986 (Devaquet e as universidades), de 1990 (Jospin e os direitos dos estudantes), de 1994 (Balladur e o contrato de inserção profissional-CIP), de 2005 (Fillon e a reforma do bac [equivalente ao vestibular]) e de 2006 (Villepin e o contrato primeiro emprego-CPE), aos quais devem-se acrescentar os tumultos urbanos de 2005, houvesse definitivamente bloqueado o pensamento do poder público, paralisado unicamente pela questão da manutenção da ordem.
Ora, do ponto de vista das elites políticas atuais, os movimentos dos jovens não são somente perigosos em termos estritamente policiais. Eles o são muito mais quanto à essência, como mostram os trabalhos do sociólogo Louis Chauvel sobre os processos de rebaixamento social. Porque eles podem desestabilizar a relação entre gerações. Porque eles obrigam todos a verem como se opera a distribuição das riquezas entre faixas etárias. Porque eles levam a reavaliar as gerações no poder há 40 anos e a questionar a distribuição das dívidas entre os mais idosos, que se beneficiaram diretamente disso, e os mais jovens, que deverão pagar por isso.
O segundo tabu diz respeito à diversidade étnica. As elites políticas francesas – é muito menos verdadeiro para as elites econômicas – não se conscientizaram da nova cara da sociedade francesa, especialmente em suas grandes cidades, especialmente entre os jovens. A França continua a se ver como uma sociedade branca e relativamente uniforme. Em suas zonas urbanas, ela é na realidade totalmente mestiça. A ponto de a linguagem da periferia e a cultura urbana serem hoje as dominantes entre os jovens, fenômeno social e cultural subestimado.
Mas essa mestiçagem é acompanhada de um movimento de guetificação – outra realidade que perturba o poder público – com bairros que, na verdade, concentram os pobres, os jovens e os imigrantes em proporções inéditas. Ora, essa segregação não é neutra em termos de comportamento e de atos de violência, como acaba de mostrar o pesquisador Hugues Lagrange em seu livro “Le Déni des Cultures” [“A negação das culturas”, Ed. Seuil]. Se os parlamentares se preocupam como o risco de reprise dos tumultos do outono de 2005, se agora ocorrem incidentes em cada movimento estudantil, é primeiramente um efeito bumerangue da segregação urbana, social e étnica.
O movimento estudantil atual causa medo nos políticos, tanto de direita quanto de esquerda, porque ele reúne as problemáticas da juventude e da periferia, da igualdade entre gerações e da igualdade entre territórios. O problema é que as elites políticas não têm nenhum interesse em abordá-los de frente. A curto prazo – que é o tempo do político - , na verdade nem os jovens, nem a periferia têm rendimento eleitoral: os menores de 18 anos não votam, os jovens adultos se abstêm mais do que o resto dos eleitores, infinitamente mais que o eleitorado mais velho. A menos de dois anos da próxima eleição presidencial, o medo dos jovens continua sendo vantajoso.
Tradução: Lana Lim
Via LE MOND
Luc Bronner
@joseanair
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